6.10.12

HISTÓRIAS DE GIBI: JOÃO LABREGO

Ao ler os comentários do amigo João Labrego colocados no "Chutinosaco"...achei necessário colocar sua opinião aqui, numa postagem especial sobre o compartilhamento - a internet - a paixão pelos gibis, nosso passado presente, reflexões - enfim... mais uma autêntica "história de gibis"! Só peço aos amigos, colaboradores e visitantes que deixem um comentário  abaixo sobre este texto emocionado e maravilhoso.  Na verdade, ele fala por todos nós!

"Lembro-me dos anos 70, quando a TV ainda não era tão difundida como hoje e tínhamos nas bancas de jornais nossa principal fonte de entretenimento: revistas em quadrinhos, bolsilivros, fotonovelas, jornais, etc.

Hoje, ao entrar neste blog à cata de novidades senti-me como se estivesse nos anos 70 procurando avidamente pelas novidades gibizescas e não fiquei nem um pouco decepcionado.
Naquela época valorizava-se a leitura e se ensinava melhor nas escolas justamente porque o povo tinha na leitura sua principal fonte de entretenimento.
Hoje, com a popularização da TV, dos video-games, da Internet, etc. pouca importância se dá nas escolas ao ensino da língua portuguesa.
Concordo em gênero (apenas masculino e feminino), número e grau com suas palavras mas o que vejo no mundo é a super-valorização da socialização do indivíduo, ou seja, torná-lo carente de recursos que o façam sentir-se bem de maneira individual.

A religião, por exemplo, ajuda o indivíduo a nunca sentir-se só pois convence o indivíduo de que ele sempre terá Deus ao seu lado pronto a ouvi-lo e ajudá-lo nos momentos mais difíceis de sua vida.
Por esse motivo a religião vem sendo atacada constantemente.
O hábito da leitura como forma de entretenimento também tem o mesmo efeito sobre os indivíduos, ou seja, quem sabe ler e gosta de ler tem uma fonte inesgotável de entretenimento por toda a sua vida e nunca se sentirá só pois sempre terá nos livros seus melhores amigos e companheiros que o ajudarão a suportar melhor os momentos de tédio que a vida lhe oferecer.
A família também é uma fonte de satisfação para o indivíduo de muitas de suas necessidades na vida. Quando a pessoa sente-se solitária costuma visitar seus parentes e, através do amor de um pelo outro, consegue amenizar a solidão em si.
Oras, pergunto eu: qual o objetivo de se retirar da população esses recursos?
Eu mesmo respondo: as economias do mundo ocidental evoluiram de tal maneira que para continuarem crescendo indefinidamente é necessário que se fomente o consumismo entre o povo.
Quanto mais solitário o povo se sentir mais necessitado ele ficará do mercado e dos lazeres públicos que este lhe oferecer.
Muita gente de minha geração acha que não é mais possível na idade em que estamos voltarmos a gostar de revistas em quadrinhos como antigamente.

A questão é apenas de dispender algum esforço e constância no mesmo, pois nosso cérebro ainda tem muitas vias neurais que foram interrompidas no passado em função de novas necessidades que foram surgindo.
Por exemplo, quando chegamos à adolescência não tínhamos mais como nos ocupar de nossas frustrações infantis relativas a gibis que ainda não tínhamos lido, já que a necessidade de parecermos adultos para as garotas era soberana em nós.
Hoje, já passado dos 40 anos de idade e tendo as minhas necessidades de homem adulto já satisfeitas, para mim é com grande satisfação que retomo as leituras de minha infância sinto o mesmo prazer que sentia antes e até mais ainda, pois fui uma criança muito frustrada em minhas vontades infantis e depois de adulto não tive mais como pensar nelas para satisfazê-las, sem passar por idiota ou infantil aos olhos dos outros.
Meu conceito infantil de ser rico era ter uma caixa com centenas de gibis para eu ler, livros de aventuras aos montes e também uma TV para assistir meus filmes e seriados.
Hoje, tudo isso se realizou através da Internet pois tenho todos os filmes e seriados gravados em HDs e os assisto, tenho um acervo de mais de 20.000 gibis em formato digital, tenho mais de 50.000 ebooks em formato PDF, enfim, todos os meus sonhos infantis se realizaram e hoje não carrego mais aquela sensação de pobreza dentro de mim.
É verdade: eu, mesmo ganhando bem, sempre me senti pobre e estranhava isso. Não entendia o que ocorria comigo e por isso, eu não conseguia crescer socialmente, limitando-me aos meus amigos de infância e da escola para me relacionar socialmente.
Depois dos 40 anos de idade em que fui realizando meus sonhos de riqueza da infância, comecei a sentir pela primeira vez em minha vida que sou uma pessoa rica.
He, he... A gente tenta se compensar de uma infância insatisfatória através do dinheiro mas não adianta muito enquanto não satisfizermos aquela criança que fomos no passado em seus sonhos de grandeza e riqueza na vida."


JOÃO LABREGO - OUTUBRO DE 2012 


4 comentários:

  1. He, he... Jamais imaginei que esse meu desabafo fosse parecer sincero ou legítimo aos ouvidos e olhos de alguém.


    Fui o filho caçula de uma família de 8 irmãos, cujos gostos eu ía copiando e aprendendo a ser feliz com o que os mais velhos faziam como lerem gibis e apreciarem o conhecimento e os estudos.

    Quando eu estava, por exemplo, apaixonado pelos quadrinhos eles, meus irmãos, já estavam interessados em outras coisas que eu não conseguia compreender.

    Por isso, lá no fundo do meu íntimo, eu torcia para que eles conseguissem um emprêgo e se dessem bem na vida, pois, dessa forma, eles acabariam gastando seu dinheiro justamente naquilo que eu mais adorava: gibis.

    O problema é que eles passavam a gastar dinheiro em coisas que não faziam sentido para mim, ou seja, sempre achei que as pessoas eram fiéis ao seu modo de ser antigo e jamais imaginei que as pessoas pudessem nos trair em nossas expectativas sobre elas.


    Oras, se minha família se desse bem, e se deu bem de fato, fosse fiel aos seus sonhos infantis e não me criticasse pelos meus, tenho certeza de que todo mundo teria se dado bem.

    O problema é que éramos filhos de um casal imigrante português e precisávamos desesperadamente de um imaginário próprio que nos movesse e nos motivasse pela vida afora.


    Esse imaginário só poderia mesmo ser dado pela seriedade com que conduzíssemos nossas fantasias infantis e aquilo que os gibis nos proporcionaram como sentido da vida.

    Foi muito doloroso para mim assistir à derrocada de meus irmãos na vida, ou seja, sucumbirem ao despêro, à depressão e à falta de sentido na vida.

    Eu, para não cair nas mesmas armadilhas que eles, procurei realizar cada vez mais em minha vida adulta as minhas fantasias infantis e não me afastar muito delas.


    Conclusão: juntando os salários de meus irmãos e, inclusive a aposentadoria de meu pai, não dá o meu salário atual.


    É claro que nada disso teria sentido se não fosse também a consciência de que aquela criança que eu fui, hoje precisa de praticamente 100% de minha atenção de adulto.

    Muita gente diz que eu sou egoista, individualista, etc... mas não querem nem sequer ouvir quando começo a relatar como foi minha infância e minha adolescência.


    É muito fácil cobrar de alguém depois de adulto que se ocupe dos problemas alheios mas quem se ocupou dos meus quando eu me vi mais carente na vida?

    Ninguém, oras.

    Por isso, não quero condená-los por serem do jeito que são mas sim absolvê-los das culpas que tentam lhes imputar.

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    1. João Labrego, te digo conscientemente que suas lembranças demonstram o quanto nós vivemos os quadrinhos como expressão e definição em nossas vidas...o delinear de nosso caráter, a definição de familia, amizade...valores hoje expurgados em muitos lares!
      Por isso sua história é importante e digna de publicação, pois como disse na apresentação da postagem...sua história é um pouco da nossa também! Muito obrigado!

      Um grande abraço!

      Luiz Dias

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    2. Senhor Luiz Dias:

      Às vezes, realmente, eu me sinto um idiota atualmente por não ter vivido mais a minha vida e tentado transformá-la naquelas fantasias que minha época pregava como verdadeiras e reais.

      Eu tive a sorte de, em pleno regime militar, endossar inconscientemente a ideologia vigente, que inclusive coincidia com as situações vivenciadas através das histórias em quadrinhos.

      O que muito pouca gente acredita é que o ser-humano é capaz de dar sentido à uma ideologia que para muitos é sem sentido, pois esse sentido depende de um imaginário particular e quase único por parte do indivíduo que o defende.

      Como, de certa forma, minha família se pautou na hierarquia pela idade, os mais novos (que era eu) tinham que abrir mão de suas vontades em favor dos mais velhos (que eram meus irmãos).

      Aceitando isso e me ilustrando nos personagens de Walt Disney, os quais eu procurava desesperadamente copiar, eu tentava passar a perna nos meus irmãos mais velhos, demonstrando saber mais do que eles.

      O chato disso é que quando eu tentava mostrar aos meus irmãos que eu sabia o mesmo que eles, eles, ao invés de me encorajarem, faziam questão de me colocar no meu devido lugar, ou seja, sempre abaixo deles.


      Hoje é fácil a gente lembrar-se dessas coisas mas, confesso, se eu me lembrasse dessas coisas há alguns anos atrás eu teria feito besteira na vida.


      Por isso, acho importante as estórias em quadrinhos que, diante de certas necessidades a cada instante da vida, procuram nos dar a melhor maneira de solucioná-las sem prejudicarmos a lei e a ordem institucionalizadas.

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  2. Luiz Dias:

    Nossa! Como as postagens acima parecem sem sentido depois que as colocamos no papel e as lemos depois de algum tempo.

    Parece-me que sob o influxo das lembranças e sentimentos que afloram num determinado momento, a gente tenta dar um sentido mais bonitinho para eles mas só sai besteira. He, he.

    Eu mesmo não me reconheço nas palavras acima, visto que as mesmas foram escritas num momento de catarse emocional em que as lembranças estavam bastante vivas em minha memória e eu procurava coordená-las, a fim de dar-lhes um sentido mais adequado.

    He, he.

    A única postagem digna de expressar meu pensamento é a primeira que você chamou de Histórias de Gibis.

    O resto, foi uma tentativa de meu ego adulto de conferir aos meus impulsos infantis do passado uma aparência mais boazinha e menos má.

    Por exemplo, quando eu digo que torcia para que meus irmãos se dessem bem na vida eu na verdade queria era que eles se ferrassem mesmo pois só viviam me ferrando.

    Por eu tentar inventar uma mentira em cima disso todo o meu texto saiu sem pé nem cabeça.

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